7.6.09

Grandes Malacos

Então, ainda falando de nostalgia e de desenhos. Me deu vontade de republicar uns verbetes da Galeria dos Grandes Malacos, uma das seções de um site que fazíamos aqui, em Santa Catarina, logo após a citada revista Gárgula, do post abaixo: O Malaco. O e-zine ficava alojado no antigo HPG e foi tirado do ar, mas acho que ainda temos os arquivos guardados em algum lugar. Mais tarde, quando voltamos à net com um outro projeto, a mesma seção foi integrada ao Marca Diabo, este sim ainda disponível na rede.

Basicamente, a Galeria era um depositário de figuras que admirávamos de todos os campos de atuação, cinema, música, quadrinhos e afins. Vou republicar neste post dois dos verbetes que escrevi e que foram ilustrados pelo Ivan Jerônimo.



DICK, Philip K. - Se a intenção de Hollywood com Uma Mente Brilhante era contar a história de um criador genial envolvido em um mundo de paranóia e maluquice, a platéia teria muito a ganhar se o matemático mala John Nash fosse substituído pelo escritor Philip Kindred Dick (1928-82). Ganharia muito mais ainda se não houvesse os famosos cortes melosos (como aqueles que tornaram o giletão do Nash em um marido fiel e salvo da tal paranóia pelo amor incondicional de sua esposa...) e focasse a vida regada a anfetaminas, um pouco de LSD e a meia dúzia de casamentos malsucedidos de Dick. Se não levou um Nobel, o escritor recebeu o prêmio máximo da categoria a que se dedicou por um quarto de século, a literatura sci-fi. O Homem do Castelo Alto, escrito há meio século, foi laureado com o Hugo Awards por sua versão alternativa da II Guerra, com os EUA dominados por alemães e japoneses.

Essa obra, aliás, é um bom exemplo dos métodos exóticos empregados por Dick. O livro foi feito com a ajuda do I-Ching (aquele texto chinês que mistura filosofia e adivinhação). Nas centenas de escritos do cara, sua marca registrada sempre foi um mundo caótico e uma profunda desesperança. Caso do mais famoso deles, Do Androids Dream of Electric Sheep?, de 68, que inspirou o filme Blade Runner, e também do conto de 31 páginas que inspirou o mais recente Minority Report. Aquele improvável filme sobre a vida desse autor nada ortodoxo não poderia deixar de falar da sua fase mais pirotécnica, quando ele se dizia sintonizado com uma divindade alien (ou algo que o valha) chamada VALIS (Vast Active Living Inteligence System) ou sobre as mensagens piradas que ele extraia de músicas dos Beatles, ou, melhor ainda, das notícias que ele ouvia (vindas de um rádio desligado) de uma certa Associação dos Países Portugueses da América... Tudo isso somado faria as viagens daquele matemático sobre a CIA e o FBI parecerem coisa de guri pequeno.

SCORSESE, Martin - Hollywood só não pode ser considerada o mais superestimado latifúndio improdutivo do planeta porque diretores do gabarito de Martin Scorsese surgiram nos anos 70 para espantar o puritanismo reinante. Enquanto o mundo enlouquecia na década de 60 e o clima era coerentemente captado pela música, pelos quadrinhos, pela literatura e até pelas artes plásticas, tudo o que o cinema americano tinha para oferecer eram contos de fadas com final feliz.

Foi a geração de Scorsese que impediu a repetição da história nos dez anos seguintes, e o impacto que tais pessoas provocaram fez valer a fama de "Década dos Diretores". Isso até a poeira baixar nos últimos tempos, fazendo todo o poder voltar às mãos dos produtores e sua sanha de tirar dinheiro de nossos bolsos a todo custo. De todos os seus companheiros de empreitada, mais notadamente, Francis Ford Coppola, George Lucas e Steven Spielberg, Scorsese é o que tem a obra mais consistente, ao mesmo tempo sem os altos e baixos ou os apegos comercias tão marcantes nas carreiras dos demais. Além disso, o diretor de obras-primas como Taxi Driver, Touro Indomável, Cabo do Medo, Os Bons Companheiros, entre vários outros, é o mais malaco de sua geração, o que torna sua presença nesta lista obrigatória.

O que poderia ter sido um talento desperdiçado caso seguisse o desejo de virar padre, felizmente foi em outra direção, fortemente inspirada pelos muitos amigos de infância que acabaram virando gangsters. Uma prova da citada malaquice é dada pelo jornalista Peter Biskind, no livro Easy Riders, Raging Bulls. O autor conta que no lançamento do documentário The Last Waltz, no Festival de Cannes, Scorsese se mostraria irredutível ao ver que seu suprimento pessoal de cocaína havia acabado. O diretor decretou para quem quisesse ouvir: "Sem cocaína, sem entrevista". A saída dos produtores foi arrumar um avião e ir para Paris renovar o estoque do malaco.

3 comentários:

Anônimo disse...

Muito interessante este post estilo "lado B dos gênios". :-)

Romeu Martins disse...

Hehe, era uma tradição de dois outros projetos que participei, O Malaco e o Marca Diabo.

Anônimo disse...

Eu adorava a galeria dos grandes malacos, eu nunca esqueci o do Scorcese, ainda bem que você o publicou aqui.

Procurei agora para mostrar para uns camaradas e encontrei os autores. Parabéns, espero que vocês consigam publicá-los novamente.

Um abraço.
Gui Kominami

Ibope